sábado, 6 de outubro de 2012

LEI DA FICHA LIMPA


FICHA LIMPA

Eficácia da lei depende do eleitor

06.10.2012
Apesar do otimismo gerado pela aplicação da lei, especialistas se mostram cautelosos quanto aos seus efeitos
Amanhã, dia 7 de outubro, data do primeiro turno das eleições municipais, o eleitor terá mais uma vez a oportunidade de escolher seus representantes no Executivo e Legislativo municipal. A principal novidade para o pleito deste ano é a Lei da Ficha Limpa, uma espécie de filtro criado a partir de um projeto de iniciativa popular para impedir, por exemplo, que pessoas condenadas por órgão colegiado da Justiça participem do pleito.

Francisco Moreira acredita que a Lei da Ficha Limpa terá um caráter pedagógico neste pleito, mas que não se deve criar grandes expectativas FOTO: VIVIANE PINHEIRO

Apesar do otimismo gerado devido à aplicação da lei, especialistas se mostram cautelosos quanto os seus efeitos na política. A avaliação é de que não adianta barrar candidatos "fichas suja" se o eleitor continuar a endossar, por exemplo, candidaturas apoiadas por eles. O entendimento, portanto, é de que a Lei da Ficha Limpa exercerá um papel importante no pleito deste ano, mas não conseguirá resolverá o problema da corrupção sem a participação efetiva do eleitor.

Para estudiosos, pouco terá adiantado o trabalho dos Tribunais Regionais Eleitorais de todo o País na aplicação da Lei da Ficha Limpa sem essa colaboração. Por exemplo, um candidato que teve sua candidatura barrada pelo TRE poderá participar do pleito caso tenha recorrido ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ou então, caso aquela Corte confirme o indeferimento, ele poderá indicar o cônjuge, filho, irmão ou outro que tenha ficha limpa, para disputar o pleito em seu lugar.

Pedagógico
"Um processo democrático, ele exige um eleitor consciente do poder que tem. E a decisão dele, na hora da escolha do candidato, é fundamental para o exercício da democracia", diz Francisco Moreira Ribeiro, cientista político e professor do curso de Direito da Unifor. Ele acredita que a Lei da Ficha Limpa terá um caráter, sobretudo, pedagógico no pleito deste ano, mas que não se deve criar grandes expectativas quanto ao combate à corrupção.

"Você pode olhar essa forma de criar mecanismos, filtros, mas isso não garante essa melhoria", diz o professor, para quem o ideal seria que esse filtro fosse feito pelos partidos políticos, quando escolhe os seus candidatos, e, principalmente, pelos eleitores, na hora do voto. "Pessoas envolvidas, direta ou indiretamente, em casos de corrupção nem se colocariam como candidatos se o eleitor fosse mais consciente", ele acredita.

Não faltam exemplos no País de políticos envolvidos em escândalos amplamente divulgados e que ainda assim foram eleitos. Um dos casos emblemáticos é o do ex-presidente da República Fernando Collor de Melo, que mesmo tendo sofrido um processo de impeachment, que culminou no seu afastamento da Presidência em 1992, elegeu-se ao Senado Federal em 2007, onde ocupa uma cadeira desde então.

A professora de Filosofia Política da Universidade Federal do Ceará (UFC), Mirtes Amorim, atribui fatos dessa natureza ao baixo nível de consciência política do eleitorado em geral, que não compreendendo a sua responsabilidade, não se mobiliza. "Eles acabam votando de acordo com aquela antiga expressão: ele rouba mas faz". A professora lamenta, no entanto, que pessoas com posturas éticas e com bons projetos, também acabem sendo vistas de maneira negativa, devido apenas à generalização que se faz da classe política.

Mirtes Amorim diz que o eleitorado, pelo baixo nível de consciência política, não compreende sua responsabilidade sobre a Ficha Limpa FOTO: BRUNO GOMES

Responsabilidade
Comumente, a responsabilidade por casos de corrupção ou de má gestão recai apenas sobre os políticos. Porém, o eleitor também é responsável, já que é o seu voto que legitima os mandatos dessas pessoas. "O eleitor não assume o seu real papel, que é excluir essas pessoas da vida pública", argumenta Francisco Moreira. "Às vezes, pessoas sem a mínima condição se colocam como candidatos para atingir benefícios próprios e se elegem. E o eleitor é responsável por isso", diz o estudioso.

Alguns atribuem a ocorrência de fatos desse tipo à pouca escolaridade do eleitor ou pelo seu baixo nível de informação. E que especialmente as populações mais desinformadas são usadas como massa de manobra por partidos e candidatos.

Perigosíssimo
Mas há casos também em que o eleitor se submete ao candidato trocando o seu voto por algum benefício imediato ou pela expectativa de recebê-lo futuramente, caso determinada pessoa seja eleita. "Esse voto é perigosíssimo", alerta Mirtes Amorim. "As pessoas identificam a política com corrupção, com roubalheira. E, por entenderem a política por esse lado negativo ´vendem´ o seu voto por um beneficio pessoal", acrescenta.

Mas não são apenas pessoas desinformadas que votam em candidatos "ficha suja". No entendimento de Rui Martinho Rodrigues, doutor em História e professor da Universidade Federal do Ceará, o eleitor que "vende" o voto é, sobretudo, um desiludido com a política, que não se sente representado por qualquer candidato. "Então ele pensa que a única coisa que ele pode fazer é vender o voto", diz o especialista. "Não tem ninguém tolo. Eles têm as suas razões".

Escolaridade
Quanto à questão da escolaridade, Francisco Moreira nota que até mesmo pessoas com maior grau de instrução não conseguem ter compreensão de seu papel político. "A minha avaliação é que, como essas pessoas não têm preocupação com a coisa pública, elas se baseiam muito no sentido de que: ´eu voto nesse candidato que fez ou pode fazer alguma coisa por mim´. Grande parte da população está interessada em saber como vai se beneficiar", afirma.

Além da questão da corrupção, na visão de estudiosos, a desilusão do eleitor em relação à classe política decorre também das promessas não cumpridas. "A política está se tornando uma coisa a que as pessoas têm ojeriza, e então se afastam", diz Francisco Moreira.

Apesar de não esperar grandes mudanças no cenário político com a aplicação da Lei da Ficha Limpa, Moreira faz questão de destacar o trabalho feito pelos Tribunais Regionais de todo o Brasil. Apenas no Ceará, o TRE indeferiu os registros de 78 candidatos aos cargos de prefeito, vice-prefeito, com base na Lei da Ficha Limpa.

O professor ressalta, porém, que os meandros da política não funcionam de acordo com o que está escrito. Já Mirtes Amorim considera a lei um instrumento importante por tornar público os nomes daqueles considerados como "ficha suja", para que permaneçam afastados do processo eleitoral.

A Lei da Ficha Limpa surgiu de um projeto de lei popular. Foi aprovada na Câmara Federal e no Senado em maio de 2010 e sancionada pela presidência da República no mês seguinte. A lei não valeu para as eleições de 2010 porque foi aprovada há menos de um ano do pleito. 
FONTE - DIÁRIO DO NORDESTE









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